sábado, 26 de dezembro de 2009

OS EMBALOS DOS SÁBADOS E DOS OUTROS DIAS DA SEMANA

Já tentei falar, explicar, o que significou o filme Os Embalos de Sábado à Noite para a geração do final dos anos setenta e início dos oitenta, por mais que a pessoa, que não viveu aquela época, diga “eu imagino como deve ter sido”, na realidade, ela não consegue imaginar, só quem viveu esse período sabe o que foi.
Sinceramente, não imagino um outro filme que tenha influenciado tanto, na realidade, influenciou toda uma geração e, o mais impressionante, cada lugarzinho do planeta.
O filme Os Embalos de Sábado à Noite foi um feliz coincidência, harmoniosa soma de belas canções dos Bee Gees + John Travolta + um roteiro despretensioso = Os embalos de sábado à noite. O filme é simples. E é bom exatamente por isso. Não se pode querer torná-lo um excepcional filme, mas o resultado que ele alcançou foi impressionante. As crianças e jovens saiam do cinema querendo dançar, todos queriam ser o Tony Manero (John Travolta), inclusive, John Travolta virou sinônimo de bom dançarino, qualquer um que dançasse bem a pessoa já dizia: - É praticamente um Travolta!
Após o filme, a febre foi tanta que era quase impossível encontrar uma pequena cidade do interior que não tivesse uma discoteca montada: um globo espelhado e multicor rodando, um canhão de luz e muito som de discoteca: Danna Sammer, Bee Gees, Tina Turner. Diana Ross e por aí a fora. Foi uma febre. Os jovens queriam comprar carros antigos, pintar com cores e desenhos berrantes e sair por ai “agitando com a galera”. Os mais humildes e tímidos viam uma chance de se destacar, era só dançar bem e as gatinhas estariam aos seus pés.
Para completar, o esperto e jovem novelista Gilberto Braga, "sacou o lance" e colocou no ar a novela Dancing Days com Sônia Braga, Reginaldo Farias, Bethy Farias, Glória Pires e grande elenco, parte do conflito da novela acontecia numa pista de dança de uma discoteca, foi sucesso imediato. No país inteiro as meias soquetes com brilho, as sandálias de plástico entraram na moda e a garotada rodava e se requebrava nas pistas de danças ao som da discoteca.
Você me pergunta - O que tem de especial o filme Os Embalos de Sábado à Noite? Eu respondo: Ele mostra o dia-a-dia de um jovem suburbano chamado Tony Manero, seus conflitos familiares, sua estagnação profissional e sua falta de perspectivas. A história de Tony é semelhante à de muitos rapazes pobres da sua idade: brigas familiares, emprego não qualificado (ele é balconista numa loja de tintas), pouca ou nenhuma diversão. Entretanto, no sábado à noite, na discoteca 2001, tudo era diferente: Tony era outro: elegante, admirado, desejado, o deus das mulheres, “o cara”, o Rei das Pistas! Seus conflitos familiares ficavam bem quietinhos em casa, davam um tempo, desapareciam. Afinal, no sábado à noite nada mais importava senão a música e a dança.
Mas... Os embalos de sábado à noite não se restringe a Tony Manero e sua dança empolgante, também aborda – ora superficialmente, ora de maneira relativamente profunda – assuntos interessantes (e alguns até hoje polêmicos), tais como: rebeldia, sexo na adolescência, gravidez, aborto, religião, celibato, estupro, papel da mulher na sociedade, desemprego, preconceito contra os homossexuais, racismo, amor, rejeição, amizade, arrogância, dignidade, vaidade masculina, influência da mídia na vida das pessoas, coragem, ingenuidade, violência, ascensão social. Esta última, simbolizada pela travessia da ponte que liga o Brooklyn a Manhattan, bairros de Nova York com características completamente diferentes: o primeiro, humilde e violento; o outro, luxuoso e refinado – alvo da “coroa” Stephanie Mangano, parceira de Tony num concurso de dança e por quem ele se apaixona. Em certo momento do filme, ela, deslumbrada, diz: “No outro lado do rio tudo é completamente diferente. É lindo! As pessoas são lindas, os escritórios também.”
Outro tema que merece ser citado em Os embalos... é a disputa, pois ela acontece em relevantes segmentos sociais. Por exemplo: a) familiar: entre o rejeitado Tony e seu irmão, Frank, o xodó da família – pelo menos até decidir largar a batina; b) racial: entre brancos, negros e latinos, evidenciada tanto nas brigas de rua quanto nas duplas de dançarinos que concorriam ao Prêmio da Discoteca; c) ideológico: entre o imediatismo dos jovens e a sensatez da idade madura, demonstrada pelo desejo de elevação social de Stephanie Mangano e sobretudo neste trecho em que o sr. Fusco, patrão de Tony, não quer lhe adiantar o pagamento semanal: Sr. Fusco: “...economizará e terá um futuro...” Tony: “Dane-se o futuro.” Sr. Fusco: “Não pode estragar seu futuro; ele é que irá estragar você... se não tiver tudo planejado.” Tony: “Esta noite é o futuro. E já fiz planos.”
Tony Manero é uma personagem bacana porque é complexa: com virtudes e imperfeições de caráter. Rebeldia, ingenuidade, arrogância, dignidade, violência, coragem e vaidade (entre outras) acompanham sua confusa, paradoxal – por isso mesmo, real e apaixonante – personalidade. Outra personagem marcante é Frank. Vejamos, então, o mordaz e inteligente Frank em ação em duas situações distintas. Ao ser questionado pelo irmão por que iria para uma pensão: “Ex-padres não voltam para casa. Todos (seus familiares) estão chocados demais. Perderam os pontos que achavam que tinham no Céu.” Agora, sério, aconselhando Tony: “Você só sobreviverá fazendo aquilo que considera certo. Se fizer o que eles (outras pessoas) querem, estragará a sua vida.” Isso tudo é Os Embalos de Sábado à Noite, expondo nossas angustias, frustações, preconceitos, dores, mas no nosso momento de estrela somos muito mais, somos especiais, ele fez os jovens da época, a maiorio reprimido por governos ditadores, por conceitos morais e religiosos rígidos, que a vida podia ser uma festa e cheia de luzes, mesmo que fosse por uma noite por semana. Quando a febre das discotecas estava passando veio o jeito Michael Jackson de ser, dançar e se vestir e os embalos continuaram, será sempre assim, novos embalos sempre surgirão com mais ou menos intensidade, mas com certeza maracará a geração que a viveu ou viverá. 
Hoje temos o pagode, o axé, o funk, o forró, o sertanejo - muitos desses ritmos já faziam sucesso naquela época - mas nada se compara a febre da discoteca, foi uma época, tentar revivê-la é saudosismo, ela deve viver na fantasia e nas lembranças daqueles jovens que a curtiram em sua intensidade. A batida musical, as luzes, as pistas, os jeito de dançar, o modo de se vestir vai sempre estar vivo na mente daqueles que viveram aquela época.

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